O feijão sem arroz de Maria Graham e Lima Barreto.

Muita coisa se passou desde minha última postagem aqui. Ao mesmo tempo que gosto quando alguém esbarra no blog (a maioria por conta do endereço do site na minha assinatura de email) sempre revisito os textos com muita vontade de reeditar e reescrever muitas das postagens...

Bom, a vida não permite muita edição e prefiro deixar os textos como estão para que os eventuais leitores se deparem com a evolução ou regressão da minha escrita.


Enfim,

Dessa última vez, um colega que conheceu o blog fez uma referência ao meu post de Maria Graham passeando pelo Catete, que você pode acessar aqui. Ele reparou algo que já estava na minha mente: como é recente a dobradinha tipicamente brasileira - arroz e feijão. No tempo de Graham, década de 1820 (pra você que não fez as contas, há mais de 200 anos), não havia referência ao arroz, mas o feijão e a farinha de mandioca eram os pratos nacionais.


Quase 100 anos depois, Lima Barreto também fez referência ao prato nacional, mais uma vez sem nenhuma referência ao arroz. Vejam essa passagem da crônica CONCURSO PARA A COZINHA, publicado na revista Careta, em 22 de novembro de 1919:

Não há como um bom pitéu bem temperado. Um tutu de feijão com um bom molho de tomates, cebolas e vinagre, seguido de uma carne seca picadinha, vale mais do que qualquer ofício limpo, redigidinho naquela pobretona literatura oficial, sem calor nem gosto.

Barreto ainda faz outras revelações sobre a alimentação no mesmo texto:

Semelhante iniciativa deve provir da firme disposição em que está o público brasileiro de fazer disto aqui um novo Estado Unidos da América do Norte.

Já começamos pela cozinha e havemos de chegar à sala de visitas, graças a Deus, thanks giving day!

Tomo porém, licença de notar que não podemos ficar no feijão, na carne seca... Esta está pela hora da morte!

Percebe-se que o viralatismo político hoje é o mesmo, mas o arroz ainda não era o irmão gêmeo do feijão na cozinha nacional da época. A carne seca ainda era a comida nacional.

Lima Barreto deve ter escrito com fome o artigo, pois ainda há uma terceira referência a comida:

Certo dia fui jantar com um amigo rico e ele me deu este caro menu:

Sopa de legumes;

Carne seca frita e pirão;

Bacalhoada à portuguesa, com quiabos e maxixes.

Quanto à ironia atroz do autor sobre o seu anfitrião, deixo para o leitor julgar ao se aventurar no texto original. De qualquer forma, sem querer, Lima Barreto parece reforçar a parceria feijão - carne seca - farinha de mandioca na mesa nacional, tal como em todo o período colonial.

Câmara Cascudo tinha suas teorias sobre a popularização do arroz, mas preciso investigar mais antes de me atrever a escrever qualquer coisa sobre esse tema. Quem sabe não escrevo algo antes de 2030?


Até a próxima!

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