A Praia do Flamengo é um dos locais mais antigos de ocupação europeia da cidade do Rio de Janeiro, remontando ao século XVI, com a França Antártica. Não vou tão longe na história, vou direto ao final do século XIX e falar de um tema bem específico e que tem chamado a atenção em vários posts nas redes sociais: a ponte, ou pier, ou cais do Flamengo. E vou navegar rapidamente por um tema menos conhecido, a lancha presidencial.
A Praia do Flamengo, no final do século XIX, possuía infraestrutura para banhos de mar e deu o nome para o glorioso C. R. do Flamengo, cuja sede durante muitos anos foi na atual Praia do Flamengo, 66. Na época, a praia restringia-se a uma pequena faixa de areia, próximo do balneário High Life e depois do Hotel Central. Sobre banhos de mar, indico a leitura do post do grande Victor Melo, no
Cidade Sportiva.
A Presidência da República comprou, em 1896, o Palácio do Catete e o que havia nele, inclusive uma embarcação Gaivota, de propriedade do Conselheiro Mayrink. Não encontrei nada que se referisse a um pier nesse período mas, como estou escrevendo num blog e não numa obra acadêmica, posso imaginar que alguma infraestrutura para acesso ao barco deveria existir na época.
O embarcadouro conhecido como Ponte do Flamengo foi construído junto da Avenida Beira Mar. A Revista da Semana de 5 de Janeiro de 1902 tem uma nota satírica a respeito da ponte da Praia do Flamengo:
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Detalhe da Revista da Semana, 05/01/1902, p. 2 |
Outra matéria da Revista da Semana mantinha as críticas à ponte, anos depois:
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Detalhe da Revista da Semana, 16/04/1927, p. 21 |
Uma matéria do Jornal do Brasil, em 01/12/1903, critica a construção da ponte do Catete. O cais seria, segundo a reportagem, grande para embarcações pequenas e, devido à profundidade, não permitiria a atracação de embarcações grande porte. A publicação Guide de L’Etoile du Sud cita a presença de embarcadouro de uso exclusivo do Presidente da República. O embarcadouro teria sido muito utilizado também por Artur Bernardes que, diante de sua impopularidade, o usava para sair do Palácio sem contato com a população, utilizando a embarcação do Conselheiro Mayrinck.
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Detalhe de cartão postal com o cais prolongado. Antes da década de 1920.
http://rioquepassou.com.br/wp-content/uploads/1079873440_f.jpg |
A Avenida Beira Mar era indicada como local para passeios e integrou o cotidiano lúdico da cidade no início do século XX. Além de eventos especiais, banhos de mar, regatas eram utilizados pela população, mesmo contando com restrita faixa de areia depois das reformas.
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Banhistas na Praia do Flamengo - 1910. Careta 22/01/1910, p. 25
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Banhistas na Praia do Flamengo - 1912. Careta 14/12/1912, p. 17
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Banhistas na Praia do Flamengo - 1918. Careta 16/02/1918, p. 11
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Em 1927 um hidroavião português cruzou o Oceano Atlântico e chegou ao Rio de Janeiro onde foi recebido por uma multidão na Praia do Flamengo. Aparentemente os aviadores deveriam aportar no cais do Palácio do Catete, mas de fato desceram no Arsenal de Marinha.
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Praia do Flamengo na ocasião da chegada do hidroavião português Argos. Revista da semana, 16/04/1927, p. 25 |
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Idem, p. 26. No detalhe 4, o acesso ao mar onde posteriormente foi instalado um trampolim.
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Nesse evento há também um registro da lancha Gaivota, que possivelmente é a adquirida junto ao Palácio e utilizada pelos presidentes da República.
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Idem, p.20. Acima as embarcações e, aparentemente, a Gaivota. |
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Idem, p. 21. abaixo, no detalhe, os aeronautas embarcando na Gaivota. Clique na imagem para ampliar. |
A revista O Malho, em fevereiro de 1940 , possui uma nota em que "por determinação do Governo foi iniciada a demolição da antiga ponte situada na Praia do Flamengo na parte Fronteira ao Palácio do Catete e que se destinavam embarque e desembarque do chefe de governo”.
Em algum momento entre 1940 e o início da construção do Aterro do Flamengo foi instalado um trampolim no local ou nas proximidades. Não encontrei vestígios sobre essa iniciativa, apenas fotos do mesmo. Fico grato se alguém puder esclarecer o mistério.
Nesse caso, uma infraestrutura projetada para atender à presidência da República atendeu à população em seu lazer por décadas a fio, especialmente no período em que o banho de mar deixou de ter um caráter terapêutico e passou a ser uma das principais formas de divertimento do carioca.
Referências:
O Hotel Central e os banhos de mar. Cidade Sportiva. In:
https://cidadesportiva.wordpress.com/2011/08/13/o-hotel-central-e-os-banhos-de-mar/
Revista da Semana, 5/01/1902, p. 21
Jornal do Brasil, 01/12/1903, p.1
MOREL, Charles & Henriques. Guides de L’Etoile du Sud. Rio de Janeiro: L’Etoile du Sud, 1905, p. 108. Apud Almeida, Cícero. Catete, Memórias de um Palácio. 1994, p. 51 e 59
Revista da semana, 16/04/1927, p. 20-25
O Malho, Fevereiro de 1940, p. 52
MELO, Victor. o Mar e o Remo no Rio de Janeiro do Século XIX. Estudos Históricos, V.13, n. 23, 1999
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